Ontem li um conto que me chamou atenção, por seu exesso de afetividade, digamos assim.
Contrariando todo o ódio espalhado contra essas pobres criatura (ou não tão pobres).
Pesso que reparem no que é dito por esse cidadão, tão bem intencionado, que acaba de se casar.
Caímos então na discusão sobre o casamento, que porém, não está em questão nessa postagem, deixemos isso para uma próxima vez.
Segue então o conto:
“Senhora presidente:
Na qualidade de futuro diretor-gerente das empresas dirigidas por V. Sa., e também na qualidade de seu futuro genro, submeto à sua apreciação a seguinte Agenda para a noite de núpcias.
- Os trabalhos terão início às vinte e três horas na suíte 1102 do Hotel Real Navarino. Trata-se de hotel, e do aposento, habitualmente escolhido por nubentes para a noite de núpcias. O apartamento é simpático e acolhedor; há música ambiental, suave e romântica: uma reprodução de Maja desnuda proporciona, particularmente para quem vem de um ambiente culto e refinado, como é o caso de sua filha, um sutil estímulo erótico. Providenciarei champanhe, e do melhor; entretanto, proporei de imediato um brinde. Pretendo que o efeito inebriante da bebida elimine qualquer inibição ainda presente na noiva.
- A seguir, usarei da palavra, fazendo um breve, mas emocionado retrospecto de um namoro apaixonado, de um noivado ardente; e vocarei cenas pitorescas ou temas, cômicas ou dramáticas; ao concluir, abraçarei a noiva, declarando enfaticamente que a amo.
- Beijar-nos-emos. O beijo será muito prolongado, da variedade conhecida como ‘de língua’, na qual, modéstia à parte, sou mestre. Com esse beijo tenho despertado poderosas paixões, inclusive nas mais frígidas. Ao final desse beijo, pode V.Sa. crer, sua filha estará gemendo de prazer.
- Seguir-se-à a operação de retirada de roupas. Ajudá-las-ei, transformando esse momento numa ocasião para carícias e elogios: aos belos seios, à graciosa cintura, às longas coxas, que, de acordo com Lorca, compararei a peixes movendo-se na semi-obscuriedade. Em seguida me despirei. Ela poderá constatar que seu noivo é uma bela figura de macho, alto, forte, bronzeado; e se, ao avistar o membro viril, soltar uma pequena exclamação, será não de susto, mas sim de excitação.
- Folguemos amorosos. Tomarei a iniciativa, começando por pequenos e úmidos beijos no pescoço, na nuca, nas orelhas; e nos seios. Demorar-me-ei a explorar com a ponta da língua os delicados mamilos, passando depois à sucção, o que arrancará a ela, estou seguro, numerosos e repetidos gemidos de prazer. Descendo, prosseguirei, via ventre, aos pequenos lábios, que serão acariciados e sugados. Ela então se renderá completamente e a levarei nos braços até a cama. Com a experiência acumulada em muitos anos (em camas, bancos de automóveis e macegas) decidirei sobre o momento oportuno para penetração e a
- Cópula. Será o momento culminante do programa. Tenho para mim que será uma cópula arrebatadora, uma torrente de paixão rompendo as comportas para, em meio a gemidos de prazer, culminante num cataclismo orgasmo: triunfo do amor!
Cópula realizada, direi, ainda que ofegante, belas palavras sobre os belos momentos vividos. Repetirei que a amo, que a amo. E então – sono reparador.
Para a segunda noite, a agenda será ligeiramente alterada, com a introdução de novos tipos de folguedo, e assim na terceira e quarta noites (na quinta não haverá atividades). Ao cabo de meses um padrão acabará por se estabelecer, e tudo cairá na rotina. O noivo, contudo, aguardará ansioso a oportunidade de novas experiências: outra boca a beijar, outras coxas acariciar. Boca e coxas que poderão ser as suas, senhora presidente.”
Agenda para a noite de núpcias - Moacyr Scliar
O que posso dizer, é que é no mínimo curioso.
Das duas uma, ou ele tem uma paixão reprimida por sua futura sogra, ou então está meramente interessado no seu cargo, mais exatamente em mante-lo.
Acabo de receber a informação que colocaria esse conto com a finalidade de choras, ó céus, não se pode mais analisar um texto que gere polêmica?
0 comentários:
Postar um comentário